terça-feira, 2 de novembro de 2010

"Haverá epifania mais lamentável do que aquela que sem dúvida nos deixa?"

...disse uma vez alguém por quem nutro um carinhoso, mas às vezes incrédulo, respeito (respeito ao ponto de me humilhar em público ao usar verbos como nutrir). Quando, surpreendido por tamanha clareza de espírito e sagacidade de ideias, lhe perguntei que droga estava a tomar e, principalmente, se ainda tinha alguma, respondeu "insónias". Sinceramente, esperava um cenário muito mais pitoresco onde, de olhos tresloucados, agarrava-me pelos ombros, abanava-me com a força de uma mãe viciada em farmville, e gritava "Droga? A droga da vida, João! A DROGA DA VIDA!!!111"* e procedia a correr nu pela rua abaixo, de braços a abanar histericamente no ar, até acabar debaixo de um autocarro. Seria um fim irónico para alguém que gosta tanto do Lost.

Só não lhe perguntei se não achava que a frase perdia um pouco de credibilidade por estar no twitter, onde 70% dos posts estão relacionados com movimentos intestinais, porque sou uma pessoa simpática. E porque também sou culpado de pôr pensamentos profundos no blogger onde, imagino, 70% dos posts são sobre o Twilight. Já agora, não será esta devoção a um filme sobre vampiros que brilham no escuro (como algumas estátuas da Virgem, muito famosas na década de 90, ou os brindes no chocapic) um sinal de uma decadência de ideias de uma geração e o pronúncio do fim do espírito humano? Não sei. O que eu sei é que o Edward chegou primeiro e gosta muito mais da Bella que o outro.

Mas isto vem a propósito de quê??, perguntarás tu, ocasional leitor, com uma antipatia que eu não te reconhecia e, francamente, me magoa um bocadinho.

Enquanto estava deitado na minha cama, sob o efeito da minha própria espécie de insónias, comecei a pensar na facilidade com que se pode, no nosso tempo, aprender coisas. Acredito mesmo que vivemos numa época dourada do conhecimento. Imaginem o que era há 10 (menos?) anos atrás encontrar uma informação aleatória como, sei lá, a constante de planck? Três minutos se tivéssemos um livro de física bom. Cinco minutos se tivéssemos um livro de física mau. Um mês se tivéssemos uma vida social. Hoje? 6.626×10-34 segundos. Ok, 3 segundos. Mas mesmo assim! E estamos a falar de uma das constantes mais famosas que existem. Imaginem que queríamos saber o número de pessoas que se chamam João em Portugal (quando escrevi isto não imaginei que essa informação estivesse lá - quase!). Imagino que há 10 anos atrás isso implicava ir de porta a porta, provavelmente de carroça de bois - porque só posso imaginar que era assim que os nossos avós se deslocavam em 2000 - tocar à campainha e ouvir coisas do género "Quem é o corno que me vem chatear quando o benfica está a jogar!? Logo agora que ia entrar o Eusébio? Mulher, depois de ir à porta atender, vais levar!! Qué queres dizer com "porquê"?!"

A sério. De cada vez que penso bem, por exemplo, na Wikipédia, no seu modelo de funcionamento, e de como realmente resulta, fico literalmente emocionado. Saber que se quiser (e dedicar algum esforço - pouco, do ponto de vista histórico) posso aprender a fazer bombas nucleares com a mesma facilidade com que aprendo a fazer caldo verde, é, ao mesmo tempo, inspirador, libertador, um bocadinho assustador, mas acima de tudo, fascinante.

Não acredito numa sociedade futura em que o indivíduo perde todas as suas liberdades para um estado controlador e absolutista, mas acredito que as pode perder para uma economia controladora e absolutista. Não sei se o conhecimento será sempre livre, gratuito e democrata, como quase o é agora, mas enquanto for, aproveitem.

Oh meu deus, acabei de descobrir que o Mark Zuckerberg nasceu em 1984. Coincidência? Eu acho que não, acho que não e acho que não (podia estar o dia todo nisto).

* As pessoas dizem mesmo um,um,um,um quando estão muito excitadas. Ou isso ou quando têm de ir mijar.